Além de ser uma exigência legal, a recuperação de matas ciliares pode trazer benefícios econômicos para produtores rurais do Distrito Federal. Foi o que mostrou um estudo da Embrapa Cerrados em parceria com a Universidade de Brasília (UnB) e a Universidade Federal de Goiás (UFG), conduzido em uma área de oito hectares de mata ciliar preservada, ao longo da margem direita do Rio Ponte Alta, no Gama.
A pesquisa resultou no desenvolvimento de uma ferramenta chamada Potencial de Restauração e Uso (PRU), que ajuda a selecionar espécies nativas para a recuperação de áreas degradadas, valorizando também aspectos econômicos e socioculturais, além dos ecológicos. “Utilizar espécies que oferecem alternativas econômicas pode tornar a restauração ecológica mais atraente, indo além do cumprimento das exigências legais”, explica a pesquisadora da Embrapa Cerrados Lidiamar Albuquerque, líder do estudo.
De acordo com ela, o trabalho associou critérios ecológicos importantes na seleção de espécies, agregados no Potencial Ecológico (PE), aos usos que cada espécie pode ter, calculados como Potencial de Uso (PU), para aumentar as chances de sucesso da restauração e torná-la economicamente atrativa. “Assim, a soma do PE e do PU de uma espécie compõe o PRU”, explica Lidiamar.
**Metodologia**
Para determinar o Potencial de Uso, foram levantadas, na literatura, 16 categorias de uso sustentável que cada espécie poderia ter: alimentar, artesanal, fibra, medicinal, madeira (celulose/papel), madeira (energia/combustível), madeira (serrada, roliça), ritualístico/religioso, atração de fauna, atração de polinizadores, aromático, forrageiro, ornamental, bioquímicos, ecológico, entre outros. A soma dos usos representa o valor do PU da espécie, categorizado em três níveis: baixo (1 a 4), médio (5 a 9) e alto (10 a 16).
“Já para calcular o Potencial Ecológico, primeiro avaliamos se a espécie atrai fauna, depois a projeção de copa, seguida pelo tipo de fruto e, finalmente, a categoria sucessional”, resume a pesquisadora. Com base nessa classificação, o PE de uma espécie recebe valores de 1 a 18, sendo categorizado como baixo (1 a 6), médio (7 a 12) e alto (13 a 18). Quanto maior o PE, maior a capacidade da espécie de contribuir para a restauração ecológica.
Como o Potencial de Restauração e Uso de cada espécie é a soma dos respectivos valores do PE e do PU, os valores do PRU também podem ser baixos (2 a 10), médios (11 a 21) ou altos (22 a 34).
**Resultados**
O levantamento da flora realizado no Gama identificou 93 espécies lenhosas de 41 famílias botânicas. Dessas, 70% têm PRU médio ou alto e algumas, antes pouco consideradas pelo baixo Potencial Ecológico, podem ganhar espaço graças ao alto Potencial de Uso.
As 93 espécies contam com pelo menos uma categoria de uso, sendo que todas têm uso ecológico. As demais categorias de uso mais frequentes são a atração de polinizadores, ornamental, madeireiro (construção em geral) e medicinal. A espécie com o maior PU (13) foi Zanthoxylum rhoifolium Lam. (mamica-de-porca). A maioria das espécies (53,8%) tem PU médio, enquanto 36,5% PU baixo e apenas 9,7% PU alto.
Das espécies avaliadas, 45 (48,4%) apresentam Potencial de Restauração e Uso médio, 27 (29%) PRU baixo e apenas 21 (22,6%) PRU alto. As três espécies com os maiores PRUs também obtiveram valores de PE e PU altos — Z. rhoifolium Lam. (17 e 13), Tapirira guianensis Aubl. (tapirira) (17 e 11) e Simarouba versicolor A.St.-Hil. (perdiz) (17 e 11).
Para os autores, a combinação de benefícios ecológicos significativos com os PUs das espécies pode aumentar o interesse pela restauração ecológica, tornando esse tipo de avaliação mais relevante. Lidiamar Albuquerque ressalta que espécies com PU alto e médio podem agregar valor ao processo de restauração sem comprometer as características ecológicas vitais e a manutenção do ecossistema, além de melhorarem a aceitação por comunidades ou produtores rurais devido aos ganhos econômicos e benefícios alternativos. “Outra vantagem é o fato de que essas espécies podem oferecer aos pequenos produtores um seguro contra mercados futuros incertos”, destaca.