O sociólogo francês Christian Laval, professor emérito da Universidade Paris Nanterre e um dos mais influentes pensadores contemporâneos sobre o neoliberalismo, avalia que há duas grandes urgências globais na atualidade: o clima e a verdade. “Precisamos defender ambos ao mesmo tempo. A verdade sobre o clima e o clima da verdade”, observa.
O pesquisador esteve em Brasília para participar do seminário **Educação Insurgente**, promovido pela Escola da Árvore, e também ministrou a palestra **“Neoliberalismo, neofascismo e democracia”**, promovida pela Faculdade de Comunicação e pelo Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB). Em entrevista exclusiva ao *Correio*, ele falou sobre sua trajetória, as parcerias intelectuais com o filósofo Pierre Dardot, o conceito do “comum” e a virada recente para a literatura.
Autor de obras de grande repercussão no Brasil, como *A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal* (Boitempo, 2016) e *Comum: ensaio sobre a revolução no século XXI* (Boitempo, 2017), Laval é reconhecido por suas análises sobre a racionalidade neoliberal e suas implicações na educação, nas relações de trabalho e nas subjetividades humanas. “O neoliberalismo não é apenas uma política econômica. Ele molda a maneira como pensamos, sentimos e vivemos. É uma prisão mental que nos faz acreditar que não há alternativas possíveis”, explicou.
Seu percurso intelectual começou na filosofia. “Nos anos 1980, trabalhei sobre o utilitarismo, especialmente Jeremy Bentham, e me tornei uma espécie de especialista nesse autor”, conta Laval. A partir dessa pesquisa sobre a modernidade e as origens ideológicas do capitalismo, aprofundou sua crítica à racionalidade neoliberal.
A virada para a crítica social mais ampla ocorreu ao reencontrar o filósofo Pierre Dardot, amigo de juventude. Juntos, desenvolveram um pensamento voltado a compreender e resistir à lógica neoliberal, resultando em obras de impacto, como *A nova razão do mundo*. Posteriormente, passaram a investigar alternativas que propõem o “comum” como princípio político e institucional capaz de superar a divisão entre Estado e mercado.
“O comum não é uma utopia abstrata. Ele nasce de práticas concretas de cooperação, comunicação e autogoverno. São experiências que existem em muitos campos — na educação, na vida urbana, na cultura digital — e que buscam formas democráticas de organização para o bem de todos.”
Em Brasília, Laval alertou para o caráter autoritário do neoliberalismo e defendeu a articulação de lutas ecológicas, feministas, sociais e antirracistas. “Essas lutas precisam se transversalizar. Não há mais separação entre elas. Todas se unem em torno de uma mesma aspiração à igualdade.”